SERVIÇO DEVOTADO PARA DEUS
Capítulo 12:1-8
Nos primeiros oito versículos do capítulo 12, Paulo traça uma ordem
moral das coisas que ocorrem nas vidas daqueles cujos corações foram tocados
pelas compaixões de Deus e pelo amor de Cristo. Essas coisas são como uma
corrente, construindo-se de um elo para o próximo – indo da apreciação do crente pela misericórdia e
graça de Deus, até a sua consagração
ao serviço de Deus.
APRECIAÇÃO (cap. 11:33-36)
A
doxologia no final do capítulo 11 forma uma transição natural (uma ponte) para
as exortações práticas deste capítulo. Como já observamos, refletir sobre tudo
o que aconteceu nos onze capítulos precedentes, terá um efeito positivo sobre o
crente. Isso produzirá uma apreciação sincera pelo que Deus fez para salvá-lo e
será expresso em louvor e agradecimento. Esta é realmente a fonte para todo o
comportamento Cristão correto. Vamos, então, reservar tempo para considerar (e
meditar sobre) o que Deus fez por meio de Cristo para Sua própria glória e para
nossa bênção; isso nos fará Cristãos agradecidos e dedicados.
DEDICAÇÃO (cap. 12:1)
Supondo
que o coração do crente esteja cheio de apreciação pelo que Deus fez, Paulo
imediatamente roga pelos direitos de Cristo na redenção. A “compaixão de Deus” ao nos alcançar e nos salvar a um grande custo
para Si mesmo, não apenas requer agradecimento, mas também a entrega de nossas
vidas à causa de Cristo neste mundo. Paulo, portanto, convoca a dedicação de
nossas vidas como uma resposta apropriada. Ele diz: “Rogo-vos, pois, irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis os
vossos corpos em sacrifício vivo, santo e agradável [aceitável – JND] a Deus”.
Nota: ele não diz, “Ordeno-vos, pois, irmãos...” porque não é a obediência
legal que Deus deseja do Cristão. Nossa resposta natural deveria ser: Devo dar
algo em reconhecimento a Ele. O que posso fazer para Ele? Ou, como disse o
salmista: “Que darei eu ao Senhor, por
todos os benefícios que me tem feito?” (Sl 116:12).
A lógica da cruz – o que aconteceu lá – deveria levar o crente a uma
entrega incondicional de sua vida a Cristo. Isso é dedicação. Dedicar significa
“se entregar”. (Ver At 15:26 – JND).
Nas Escrituras, tem o sentido de dedicar algo a Deus (Lv 27:21, 28; 2 Sm 8:11).
“Apresenteis” está no tempo verbal aoristo
no grego, significando que isto deve ser uma coisa de uma vez por todas na vida
do crente. (Se uma pessoa sofrer uma queda em sua alma e se afastar de andar
com o Senhor, precisará dedicar novamente sua vida, mas isso não é Cristianismo
normal.) Nossos “corpos”, que antes
eram usados como veículos de nossas próprias vontades, agora, como resultado da
graça de Deus operando em nossos corações, devem alegremente ser colocados no
altar de Deus como um sacrifício a ser usado em Seu serviço.
A dedicação está intimamente ligada ao Senhorio; as duas coisas
realmente andam juntas. Reconhecer o Senhorio de Cristo envolve renunciar em
favor d’Ele o comando de nossas vidas. Tendo Cristo como Senhor da nossa vida vai além de ter Cristo como nosso Salvador. Uma coisa é conhecê-Lo como
nosso Salvador que morreu por nós e outra coisa é tê-Lo como o Senhor de nossas
vidas. O Senhorio tem a ver com o reconhecimento de Sua autoridade de forma
prática. É reconhecer que Ele é o Único que tem o direito de ordenar nossas vidas,
porque na redenção Ele reivindicou tudo o que somos e tudo o que fazemos (1 Co
6:20, 7:23). Este “sacrifício” deve
ser uma escolha voluntária do crente cujo coração foi tocado pelo amor de
Cristo (2 Co 5:14-15). É puramente uma questão pessoal; não é um exercício em
grupo.
Isso mostra que quando o coração é tomado por admiração e afeição por
Cristo, haverá um motivo inteiramente novo no crente que alterará o curso de
toda a sua vida. Os objetivos, metas e ambições pessoais que ele uma vez teve,
serão sacrificados e trocados de bom grado pela busca do que pertence à glória
de Deus em Cristo. É um sacrifício nobre que será ricamente recompensado, tanto
agora como num dia vindouro. Não vamos nos arrepender por termos dado nossas
vidas a Ele! Nunca foi encontrado um único crente que tenha entregado sua vida
a Cristo e se arrependido de tê-lo feito! Isto é verdadeiramente o caminho para
uma vida Cristã feliz e frutífera.
Existem realmente três
sacrifícios no Cristianismo:
- OFERECER LOUVOR – “Portanto ofereçamos sempre por Ele a Deus sacrifício de louvor, isto é, o fruto dos lábios que confessam o Seu nome” (Hb 13:15; 1 Pe 2:5).
- OFERECER MATERIALMENTE – “E não vos esqueçais da beneficência e comunicação [de seus recursos – JND], porque com tais sacrifícios Deus Se agrada” (Hb 13:16; Fp 4:18).
- OFERECER NOSSAS VIDAS (tempo e energia) – “Apresenteis os vossos corpos em sacrifício vivo, santo e agradável [aceitável – JND] a Deus” (Rm 12:1).
Às vezes a dedicação é
confundida com a consagração, mas há
uma diferença. A dedicação tem a ver com colocarmos algo na mão de Deus –
nossas vidas (v. 1), ao passo que na consagração Deus coloca algo em nossas
mãos – Ele enche nossas mãos com uma obra a ser feita em nome d’Ele (vs. 6-8).
Note também: Romanos 12:1 diz que este sacrifício deve ser “santo”. Deus aceitará e usará nossas vidas quando nós as
entregarmos a Ele, mas elas devem ser santas. Se não estivermos vivendo uma
vida santa, ela não pode ser aceita e usada em Seu serviço.
Paulo acrescenta que é nosso “culto
racional”. Racional deveria ser traduzido como “inteligente”. Isso significa que nosso sacrifício a Deus é algo
que pode ser racionalizado de forma inteligente e lógica. O que Paulo está
dizendo aqui é que, em vista do que Cristo fez por nós, a única coisa correta e
lógica a fazer é responder entregando nossas vidas a Ele. Também há o
pensamento aqui de que o serviço Cristão é algo que entendemos quanto ao que
fazemos e porque fazemos. Isto está em contraste com o serviço de Deus do Velho
Testamento. Quando os levitas naquele sistema realizavam seu serviço ao
oferecer sacrifícios, havia muita coisa que eles não entendiam. Por exemplo,
eles não sabiam por que deveriam cortar os sacrifícios em várias partes, etc.
Mas no Cristianismo, temos um “culto
racional [serviço inteligente –
JND]”. Quando o Senhor nos chama ao
Seu serviço – ao qual todo Cristão é
chamado – podemos realizá-lo inteligentemente. Nós sabemos por que pregamos o
evangelho; sabemos por que batizamos aqueles que creem etc.
SEPARAÇÃO (cap. 12:2a)
Paulo
então toca em algo que claramente se interpõe no caminho da entrega de nossas
vidas à causa de Cristo – o mundo. Ele, portanto, exorta: “E não vos conformeis com este mundo”. A razão pela qual precisamos
estar separados do mundo é porque o mundo e seus princípios são inteiramente
opostos a uma pessoa que faz a vontade de Deus. O mundo nos encoraja a colocar
a nós e nossos interesses em primeiro lugar. O princípio fundamental sobre o
qual o mundo se move é fazer o que queremos fazer. É-nos dito para vivermos
para nós mesmos – para o que nos agrada. Somos encorajados a nos tornarmos
felizes na busca de qualquer objeto terrestre que escolhermos. Se tivermos
algum sonho de fazer algo neste mundo ou de ser alguém neste mundo, o mundo nos
encoraja a perseguir isso. Mas todas essas buscas apenas nos conformam aos seus
caminhos, e não nos tornarão verdadeiramente felizes, nem nos serão adequadas
ao serviço do Senhor. O Cristão de boa mente, portanto, deveria ver o sistema
mundial (a sociedade dos incrédulos)
como um inimigo, e separar-se dele.
O mundo nos diz para colocar o EU
no centro de todas as nossas ações. Deus, no entanto, quer que coloquemos CRISTO no centro de todas as nossas
ações. Quando fazemos isso e procuramos fazer coisas que farão o Senhor feliz,
uma coisa estranha e inexplicável acontece – descobrimos o que realmente é a
verdadeira felicidade! De fato, quanto mais tentamos fazê-Lo feliz, mais
felizes nos tornamos! Este é um fenômeno que não pode ser explicado. É o
segredo da verdadeira felicidade, sobre a qual os homens do mundo nada sabem. É
triste dizer que muitos Cristãos também não sabem, e é por isso que vemos
tantos Cristãos perseguindo prazeres mundanos em busca de satisfação e
felicidade.
TRANSFORMAÇÃO (v. 2b)
Deus
quer usar todo Cristão neste mundo para promover a glória do Senhor Jesus
Cristo. Contudo, Ele não pode nos usar (em grau apreciável) no estado inicial
em que Ele nos salva. Simplesmente há muito ego e princípios mundanos e carnais
em funcionamento em nossos corações. Portanto, há necessidade de transformação.
Paulo diz: “mas transformai-vos
pela renovação do vosso entendimento [vossa
mente – ARA]”. Deus tem um plano
individualizado para cada um de nós, com vistas a glorificar Seu Filho. Para
este fim, Ele quer que primeiro discirnamos
e depois façamos a Sua vontade no
serviço do Senhor. Mas, visto que os caminhos e princípios do mundo tão
facilmente influenciam nosso pensamento e nos impedem de discernir Sua vontade,
precisamos repetidamente renovar nossa mente redirecionando-a para Cristo e o
que está relacionado aos Seus interesses e glória. C. H. Brown disse que
deveríamos fazer isso 50 vezes por dia! Como resultado, somos transformados em
vasos que podem ser usados para a glória do Senhor. Assim, a transformação é
realizada por um pensar renovado.
É interessante notar que no texto grego há dois radicais diferentes
usados para “forma” nas palavras “conformado”
e “transformado”. Em conformado [suschématizó] refere-se a
uma mudança superficial, mas em transformado
[metamorphoó], é uma profunda mudança interna. Portanto, a transformação
que Deus realiza em nós é uma renovação completa e duradoura de nossos seres.
Simplificando: quanto ao nosso caráter e modos, estamos sendo conformados ou estamos sendo transformados. Estamos nos movendo na
direção do mundo ou para longe dele. Podemos ter certeza de que, se as ambições
mundanas se instalarem em nosso pensamento, o processo de transformação será
grandemente prejudicado.
Quando se trata do serviço de Deus, não devemos nos concentrar no que
podemos trazer a Ele no que diz respeito às nossas habilidades. Nem devemos ser
desencorajados por nossas incapacidades. É nossa disponibilidade que Deus deseja. Se nos tornarmos disponíveis a
Ele, dando-Lhe nossas vidas, Ele nos transformará em algo útil em Seu serviço.
Assim, Paulo tocou em três
coisas que são necessárias para discernir a vontade de Deus para nossas vidas:
q
Um corpo apresentado (v. 1).
q
Uma vida separada (v. 2a).
q
Uma mente renovada que está
comprometida em fazer a vontade de Deus (v. 2b).
REALIZAÇÃO (v. 2c)
Tendo
a glória do Senhor Jesus Cristo como nosso foco, esclarece muitas coisas sobre
o discernimento da vontade de Deus para nossas vidas. Com pensar renovado, logo
discerniremos (perceberemos) o que o Senhor quer que façamos por Ele em Seu
serviço. Por isso, Paulo acrescenta: “para
que experimenteis qual seja a
boa, agradável, e perfeita vontade de Deus”. Como mencionado, Deus tem um
plano específico para a vida de todo crente, para a glorificação do Senhor
Jesus. Como não há dois Cristãos que sejam iguais, não há dois planos de vida
idênticos. Isto porque todos nós temos um lugar diferente para ocupar no corpo
de Cristo, como Paulo mostra nos versículos 4-8. O ponto principal aqui é que
todos nós temos algo a fazer por Ele (Mc 13:34), e o objetivo é o mesmo para
todas as pessoas – para glorificar o Senhor Jesus.
Notemos que Paulo não diz que devemos saber, mas sim, que devemos “experimentar” a vontade de Deus em
nossas vidas. Experimentar inclui conhecer, mas vai além disso ao se engajar na
experiência real de fazer a Sua vontade. E assim, provamos pela experiência que
ela é de fato “boa, agradável, e
perfeita”. Ao experimentá-la, descobrimos que é tão boa quanto Deus diz que
ela é. De fato, é uma alegria fazer a vontade d’Ele (Sl 40:8). Parece que todo
mundo quer conhecer a vontade de
Deus, mas isso pode ser mera curiosidade. Deus geralmente não revela Sua
vontade para tais; o conhecimento da Sua vontade é dado antes àqueles que estão
comprometidos em fazer a Sua vontade.
O Senhor ensinou isso a Seus discípulos: “Se
alguém quiser fazer a vontade d’Ele, conhecerá a respeito da
doutrina” (Jo 7:17 – ARA). Ele não disse: “Se alguém quiser conhecer a
vontade d’Ele...”. Portanto, é preciso haver uma predisposição de compromisso
de nossa parte. Quando Deus vê que estamos levando a sério, Ele nos mostrará
Sua vontade.
HUMILHAÇÃO (v. 3)
Tendo
descoberto que o que cremos é a vontade de Deus para nossas vidas no serviço do
Senhor, precisamos ter cuidado com algo que pode inconscientemente nos pegar de
surpresa – importância própria (orgulho). Assim, Paulo diz que “cada um” deve ser cuidadoso para “que não saiba mais do que convém saber”.
Isso nos mostra que há uma real necessidade de humildade na realização do nosso
serviço ao Senhor. Quando consideramos que Deus gostaria de nos usar para
promover a glória de Seu Filho neste mundo, isso deveria nos humilhar – não nos
exaltar com importância própria. Tal é o efeito normal da graça de Deus tocando
os corações (2 Sm 9:8; Ef 3:8).
Como mencionado, a humildade é muito importante no serviço do Senhor.
Se formos verdadeiramente humildes, não vamos querer servir de maneira que
chame a atenção para nós mesmos. Podemos ter ideias infladas sobre nossa
importância e isso estragará nossa eficiência. O orgulho pode nos enganar e nos
levar a imaginar que fomos chamados a fazer algo no serviço do Senhor, para o
qual não fomos chamados. Paulo, portanto, diz que precisamos pensar “com temperança [de modo a ser sábio – JND]”.
A lição aqui é: não tentemos ser algo que não somos. Pensamentos altivos sobre
si mesmo é realmente mundanismo, dos quais somos ordenados a nos esquivar.
Precisamos ter o espírito de Davi, que disse: “SENHOR, o meu coração não se elevou nem os meus olhos se levantaram:
não me exercito em grandes assuntos, nem em cousas muito elevadas para mim”
(Sl 131:1). Aparentemente, isso foi escrito depois que seu irmão (Eliabe) o
acusou de orgulhosamente tentar se envolver na luta contra Golias e os
filisteus (1 Sm 17:28).
CONSAGRAÇÃO (vs. 4-8)
Tendo
discernido o que acreditamos ser a vontade de Deus em relação ao nosso serviço
para o Senhor, isto deve nos levar a nos dedicar a esse trabalho. Isso é consagração. Consagração significa “encher as mãos” (Êx 32:29 – KJV margem;
1 Rs 13:33). Um Cristão consagrado é aquele que tem as mãos cheias (quem está
ocupado) no serviço do Senhor.
Se nossas mãos estiverem ocupadas, não teremos espaço para outras
coisas. Isto é ilustrado na consagração dos sacerdotes no Velho Testamento. Em
Êxodo 29, depois que os filhos de Aarão foram lavados com “água” (v. 4), aspergidos com “sangue”
(v. 20) e ungidos com “azeite” (v.
21), Moisés encheu suas mãos com dez
coisas que tipificam Cristo de várias maneiras (vs. 22-24). Se pudéssemos ver
aqueles sacerdotes em pé naquele dia com aquelas dez coisas em suas mãos,
imediatamente entenderíamos que eles não teriam espaço para mais nada nelas. É
assim que deve ser conosco no serviço do Senhor! Um Cristão consagrado
simplesmente não tem espaço para coisas estranhas em sua vida.
Nos versículos 4-8, o apóstolo mostra que, como cada parte de um corpo
humano tem uma “operação” diferente,
assim também cada membro do corpo de Cristo. Ele diz: “Porque assim como em um corpo [humano] temos muitos membros [desse corpo humano], e nem todos os membros têm a mesma operação. Assim nós, que somos
muitos, somos um só corpo em Cristo, mas individualmente somos membros uns dos
outros”. Isso mostra que todos nós temos um lugar para ocupar e algo para
fazer no corpo de Cristo. Deus deu uma “graça”
especial a cada membro do corpo para ocupar o lugar em que ele foi colocado (Rm
12:6; Ef 4:7). Deus também deu “dons”
aos membros do corpo para ajudá-los a servir em seu lugar eficazmente.
Alguns nos dirão que não têm um dom, mas isso não é verdade, porque a Bíblia
ensina que todos nós recebemos um dom
(1 Co 12:7; 1 Pe 4:10). Talvez nem todos tenhamos o dom para o ministério
público da Palavra – e isso é provavelmente o que as pessoas querem dizer
quando dizem que não têm um dom – mas todos nós temos algum tipo de dom. Muitas
vezes não está aparente qual é o nosso dom, e isso pode ser porque não nos
dedicamos ao Senhor como deveríamos. O Sr. Darby disse que se houvesse mais
devoção (dedicação) entre os santos, haveria mais dons evidentes. Ele não
estava sugerindo que dons vêm pela devoção, mas que quando uma pessoa se dedica
seriamente ao Senhor, seu dom será desenvolvido e se tornará distintamente
reconhecível.
Nenhum comentário:
Postar um comentário